Para quem ainda acha que futebol e política não se misturam, a pretensa criação de uma camisa vermelha para a seleção brasileira vem a calhar. Nem bem o balão de ensaio foi jogado no ar por um site que se autoproclama “especializado” em uniformes de clubes e seleções, o Brasil se viu diante de uma polêmica. Polêmica que tem na sua raiz questões políticas e ideológicas que sustentam o escancarado divisionismo entre direita e esquerda no país da atualidade.
Seja um parceiro do The Football
O chamado Fla-Flu da política insuflou o debate em torno das cores da camisa do selecionado nacional como há muito tempo não se via. Vale lembrar que o Brasil já jogou de vermelho em priscas eras do profissionalismo e, recentemente, adotou uma camisa preta em protesto contra a onda de racismo que atinge jogadores brasileiros na Europa.

Nunca, porém, o assunto provocou tanta discussão, com argumentos defendidos apaixonadamente em favor desta ou daquela tendência política.
Contra o presidente Bolsonaro?
Tirando o fato de que a ideia de vestir o escrete canarinho com uma camisa vermelha atenta contra a tradição e vira um tiro no pé na medida em que aumenta a falta de identidade dessa seleção com o povo, a nação e o país, a proposta coloca em lados antagônicos pessoas que já haviam assumido trincheiras opostas desde a ascensão de Jair Bolsonaro ao poder.
Sim, porque o bolsonarismo se valeu da camisa amarela da seleção e fez dela um símbolo da direita na campanha eleitoral, nos comícios, nas motociatas e em todas as manifestações lideradas pelo ex-presidente. Para os “patriotas” uniformizados, não bastava vestir-se de amarelo, era preciso reafirmar também uma antiga bobagem de pretenso combate ao comunismo no país representada pela frase “Nossa bandeira jamais será vermelha” – alusão direta aos partidos de esquerda, às cores do PT, do MTST e das bandeiras da Rússia e da China.
SIGA THE FOOTBALL
Facebook
Instagram
Linkedin
Threads
Tik Tok
Eis que agora a possibilidade de tingir de vermelho a camisa da seleção é vista como uma conspiração da esquerda, do Lula, do ministro Gilmar Mendes, do STF, todos “em conluio” com o presidente da CBF, Ednaldo Rodrigues. Essa tese é um esqueleto que não para de pé e só viceja nos grupos de whatsapp e redes sociais.
Interesse comercial da Nike
O que está por traz de toda essa novidade é o interesse comercial da Nike, a empresa norte-americana fornecedora do material esportivo da seleção do Brasil e de mais uma centena de nações do mundo da bola. Ainda que, a bem da verdade, a empresa não tenha dado nenhuma confirmação oficial de que esse projeto da camisa encarnada está em processo de criação. A CBF negou ao The Football.

Por ora é tudo um balão de ensaio. Tanto que já há também informações de que o projeto da terceira camisa da seleção analisa a possibilidade de opção por outras cores, com o rosa e o preto. O objetivo da ruptura com a tradição seria atingir novos públicos, não aficionados da seleção brasileira pelo seu histórico esportivo construído com as camisas amarela e azul no passado de glórias.
Mesmo assim, as redes têm sido alimentadas nas últimas 24 horas com uma enxurrada de memes, fake news e opiniões acaloradas sobre a identificação de uma classe de brasileiros que venera a camisa amarela e outra que a repugna em função de suas convicções políticas, partidárias e/ou ideológicas. Talvez se a opção fosse por uma nova camisa em tom de beterraba ou roxo ninguém daria a menor atenção ao fato. O que dá importância ao caso é a cor vermelha, cuja associação aos movimentos de esquerda é imediata.
Seja lá qual for o desfecho, o que se tira de proveito dessa pendenga é a confirmação de que futebol e política sempre andaram de mãos dadas. E, nem sempre, em nome de uma bandeira tão singela quando a escolha da cor de uma camisa. Historicamente, o futebol já foi manchado pelo sangue de ditaduras espalhadas pelo mundo, usado politicamente em benefício dos inescrupulosos de plantão e manipulado em nome da corrupção. Na maioria desses casos, a cor da camisa sempre foi um mero detalhe. Como um colarinho branco…