Para quem ainda acha que futebol e política não se misturam, a pretensa criação de uma camisa vermelha para a seleção brasileira vem a calhar. Nem bem o balão de ensaio foi jogado no ar por um site que se autoproclama “especializado” em uniformes de clubes e seleções, o Brasil se viu diante de uma polêmica. Polêmica que tem na sua raiz questões políticas e ideológicas que sustentam o escancarado divisionismo entre direita e esquerda no país da atualidade.

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O chamado Fla-Flu da política insuflou o debate em torno das cores da camisa do selecionado nacional como há muito tempo não se via. Vale lembrar que o Brasil já jogou de vermelho em priscas eras do profissionalismo e, recentemente, adotou uma camisa preta em protesto contra a onda de racismo que atinge jogadores brasileiros na Europa.

Camisa azul da seleção brasileira pode dar lugar a um modelo vermelho: CBF não confirma a informação / CBF

Nunca, porém, o assunto provocou tanta discussão, com argumentos defendidos apaixonadamente em favor desta ou daquela tendência política.

Contra o presidente Bolsonaro?

Tirando o fato de que a ideia de vestir o escrete canarinho com uma camisa vermelha atenta contra a tradição e vira um tiro no pé na medida em que aumenta a falta de identidade dessa seleção com o povo, a nação e o país, a proposta coloca em lados antagônicos pessoas que já haviam assumido trincheiras opostas desde a ascensão de Jair Bolsonaro ao poder.

Sim, porque o bolsonarismo se valeu da camisa amarela da seleção e fez dela um símbolo da direita na campanha eleitoral, nos comícios, nas motociatas e em todas as manifestações lideradas pelo ex-presidente. Para os “patriotas” uniformizados, não bastava vestir-se de amarelo, era preciso reafirmar também uma antiga bobagem de pretenso combate ao comunismo no país representada pela frase “Nossa bandeira jamais será vermelha” – alusão direta aos partidos de esquerda, às cores do PT, do MTST e das bandeiras da Rússia e da China.

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Eis que agora a possibilidade de tingir de vermelho a camisa da seleção é vista como uma conspiração da esquerda, do Lula, do ministro Gilmar Mendes, do STF, todos “em conluio” com o presidente da CBF, Ednaldo Rodrigues. Essa tese é um esqueleto que não para de pé e só viceja nos grupos de whatsapp e redes sociais.

Interesse comercial da Nike

O que está por traz de toda essa novidade é o interesse comercial da Nike, a empresa norte-americana fornecedora do material esportivo da seleção do Brasil e de mais uma centena de nações do mundo da bola. Ainda que, a bem da verdade, a empresa não tenha dado nenhuma confirmação oficial de que esse projeto da camisa encarnada está em processo de criação. A CBF negou ao The Football.

CBF vai manter a camisa amarela como número 1 na Copa do Mundo de 2026, em caso de classificação do time / CBF

Por ora é tudo um balão de ensaio. Tanto que já há também informações de que o projeto da terceira camisa da seleção analisa a possibilidade de opção por outras cores, com o rosa e o preto. O objetivo da ruptura com a tradição seria atingir novos públicos, não aficionados da seleção brasileira pelo seu histórico esportivo construído com as camisas amarela e azul no passado de glórias.

Mesmo assim, as redes têm sido alimentadas nas últimas 24 horas com uma enxurrada de memes, fake news e opiniões acaloradas sobre a identificação de uma classe de brasileiros que venera a camisa amarela e outra que a repugna em função de suas convicções políticas, partidárias e/ou ideológicas. Talvez se a opção fosse por uma nova camisa em tom de beterraba ou roxo ninguém daria a menor atenção ao fato. O que dá importância ao caso é a cor vermelha, cuja associação aos movimentos de esquerda é imediata.

Seja lá qual for o desfecho, o que se tira de proveito dessa pendenga é a confirmação de que futebol e política sempre andaram de mãos dadas. E, nem sempre, em nome de uma bandeira tão singela quando a escolha da cor de uma camisa. Historicamente, o futebol já foi manchado pelo sangue de ditaduras espalhadas pelo mundo, usado politicamente em benefício dos inescrupulosos de plantão e manipulado em nome da corrupção. Na maioria desses casos, a cor da camisa sempre foi um mero detalhe. Como um colarinho branco…

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Nelson Nunes
Nelson Nunes começou a carreira na A Gazeta Esportiva, em 1979, ainda na versão impressa do icônico jornal de esportes de São Paulo. Foi lá que ele ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo Esportivo de 1985, com uma entrevista exclusiva com Bellini, capitão da Copa de 1958. A partir dali sua trajetória o levou a mais prêmios e diversos projetos profissionais, que lhe permitiram cobrir outras Copas do Mundo e campeonatos mundiais de várias modalidades. Da GE, Nelsinho foi para o Diário Popular, para cobrir a Copa de 1990, e ficou no jornal da Major Quedinho por 23 anos, passando por todos os cargos na editoria esportes, até chegar ao posto máximo de diretor de redação, já no momento de transição do título para Diário de S.Paulo.

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