Luis Zubeldía está no centro de um debate que tem se tornado rotina nas arquibancadas — reais ou virtuais — do futebol brasileiro. Desde que assumiu o comando técnico do São Paulo, o argentino se viu colocado no centro de um ringue simbólico, onde torcedores, comentaristas e perfis de redes sociais se enfrentam em batalhas retóricas sobre sua competência, estilo e escolhas.
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A análise do trabalho do argentino à frente do São Paulo é, desde cedo, polarizada, passional e — como tem sido praxe no futebol brasileiro — dominada pela lógica das redes sociais, onde cada lance vira prova definitiva de sucesso ou fracasso.

De modo que as plataformas digitais transformaram-se em arenas de julgamento sumário, onde não há espaço para meio-termo. É nesse terreno fértil para fla-flus intermináveis que se trava o debate sobre Zubeldía.
Operário do caos
De um lado, há quem defenda o treinador com unhas, dentes e alguns sinais de cegueira. São aqueles que enxergam no treinador alguém que tira leite de pedra, que entrega mais do que o elenco limitado permite, e que tem conduzido o time com dignidade em meio a um calendário impiedoso, lesões em série e uma série de desafios pontuais. Para esse grupo, Zubeldía é um operário do caos, tentando construir algo funcional com pouco recurso.
Um herege por causa da base
Do outro lado estão os críticos ferrenhos, que não aceitam o pragmatismo do técnico. Acusam-no de retranqueiro e, pior, de negligenciar o que muitos consideram sagrado no clube: a base de Cotia. Deixar jovens talentos no banco é, para esse grupo, um pecado capital, uma afronta à história recente de um clube que fez da formação de craques um pilar da sua identidade. Uma heresia sem perdão, já que a base é um patrimônio emocional e institucional do clube.
Mas esse debate focado na figura do treinador serve de cortina de fumaça para a questão que deveria estar no centro das inquietações de todos os tricolores: a crise de gestão que corrói o São Paulo de dentro para fora. Por mais que o clube tenha sido referência administrativa em outros tempos, o que se vê hoje é uma instituição que parece ter perdido o controle das suas próprias rédeas.

O clube, que um dia foi modelo de administração e planejamento, carrega uma dívida que se aproxima do bilhão de reais. A presidência de Julio Casares, embora revestida de discurso moderno e promessas de reestruturação, não tem conseguido blindar o departamento de futebol da instabilidade que emana dos gabinetes. E quando não há estrutura, o trabalho de qualquer técnico, por melhor que seja, se torna vulnerável.
Falta de horizonte no Morumbi
Assim, Zubeldía não pode ser analisado isoladamente. Sua trajetória no Tricolor é um reflexo do clube que o abriga: competitivo em alguns momentos, inconsistente em outros e sem um projeto sólido que vá além da próxima coletiva de imprensa. Com o cofre comprometido, o poder de investimento é restrito. O departamento de futebol vive de remendos. Zubeldía pode até ser culpado por escolhas pontuais, mas responsabilizá-lo por todos os males do clube é ignorar a raiz do problema.
Enquanto o debate seguir pautado apenas por paixões — legítimas, mas míopes —, o São Paulo continuará a desperdiçar energia com seus próprios fantasmas. O problema não é só o técnico. O problema é a falta de horizonte.
Zubeldía é um reflexo do clube
No fim, a pergunta que vale ouro é: o São Paulo quer mesmo discutir o trabalho do treinador ou está apenas mascarando, mais uma vez, a falência institucional que ronda o Morumbi há anos? Ocorre que Zubeldía é um reflexo do que o clube pode oferecer hoje — e isso diz mais sobre o São Paulo do que sobre seu técnico.